segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Tempo, tempo.




O tempo passa, é verdade. As pessoas envelhecem. Assim como os rostos mudam-se os gostos. Permanecem rugas e lembranças.
Não temos controle sobre o tempo. Sem perceber, deixamos nossa boneca preferida esquecida no baú. Sem perceber, passamos a achar ridículo usar maria-chiquinha no cabelo e pampili no pé. Queremos um nike do momento, um corte moderno no cabelo. Depois, um corte discreto, e um sapato social.
As tardes já não duram tanto como antigamente. Não é mais possível brincar, dormir, assistir tv e tomar lanchinho, tudo isso entre o meio-dia e seis da tarde. As tardes, aliás,  vão sendo ocupadas por trabalho, por estudos. Responsabilidades. Quando temos oportunidade de passar a tarde em casa, veja só, passa tão rápido!
Passamos nossa infância querendo ser adultos, vestindo a gravata do pai, usando a maquiagem da mãe. Mas quando chega a hora de tudo, simplesmente temos vontade de passar a tarde brincando de bonecas ou jogando bola, sem pensar no relatório de amanhã, sem pensar nas contas que estão para vencer.
O pior mesmo é quando as pessoas esquecem do tempo que passou. Tem gente que é tão adulta que eu acho que já nasceu assim. Gente que simplesmente se esqueceu de ser criança, perdeu toda a magia. Gente velha aos seus vinte anos. Porque existem sim pessoas que são velhas com vinte anos, conheço aos montes.
O tempo passa, nos deixa rugas, não percebemos. Mas o tempo não pode tirar nossa capacidade de viver, se permitimos. A nossa capacidade de sonhar, tal como uma criança, pode resistir ao tempo, pode resistir as rugas.
É isso que faz a diferença entre o velho com rugas e sonhos, e o velho jovem amargo e vazio.

terça-feira, 16 de outubro de 2007

Coffee




Pediu um expresso com leite. Nesse dia ameno, não estava disposta a grandes emoções. Estava se sentindo como seu café, estava misturada. Nem forte, nem fraca, metade dos dois talvez. Estava com leite, e pior: estava morna. Sentiu o quente do café atravessar seu corpo todo, ela estava morna. Pensava em várias coisas enquanto mexia distraidamente a colher no seu leite com café. Pensava nas coisas frias que iria fazer em seu dia ameno enquanto se sentia morna. Pensava que o tempo estava passando e ela estava ali, na companhia de desconhecidos que estavam tão absortos como ela. Na mesa ao lado, uma mulher pedia solitária seu capuccino. Estaria também a mulher morna? Parecia. Já a pequena grande mulher que estava saindo, com seu ar até meio esnobe, aquela estava quente e forte, como café expresso puro. Exibida como café com chantilly. E era magra como café light e descafeínado.
A visão daquela mulher foi o ápice. Terminou de esfriar o que estava morno em volta da menina que comparava as pessoas com seu café. Num impulso, a menina tomou o ultimo gole, não quis pensar em mais nada, se levantou e saiu morna, morninha.

sábado, 6 de outubro de 2007

Ironia de sorriso.




Caminhava com um sorriso no rosto. Sorriso quase imperceptível, quase irônico, mas um sorriso. Assim, baixinha e um pouco (só um pouco) acima do peso, caminhava com aquele sorriso. Incomodava o tal sorriso, para quem o notava, é claro. E ela tinha vontade de gritar ao mundo. Olha, sabe eu tenho um sorriso, eu sei o que é vida, eu me descobri, Os que não me notam, não notam nem a si, não caminham com um sorriso no rosto. Cara fechada e vida automática, é isso que essas pessoas tem. Eu não, tenho um sorriso. Com esses pensamentos, o sorriso se abria ainda mais. E ela olhava as pessoas, as desafiava com seu sorriso irônico de quem tem algum segredo. Ah, e ela bem tinha um, e dessa vez nem era do seu peso que estava falando. Aquele sorriso era do segredo, do segredo da vida. Ufa, não era mais uma alienada, tinha se libertado, libertado do mundo e de suas regras, se libertado da rotina e sua chatice. Não era mais um robô, não vivia mais no piloto automático, era a própria vida em seu sorriso. E incomodava, mas também libertava.
Vai menina, com seu sorriso irônico, vai e vive a vida, vai e sinta o vento, vai. Chega de se reprimir. Vai menina. E ela foi, foi. Para nunca mais voltar ao que era antes. Foi.
(com seu sorriso).