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Fazia tempo que eu não acordava tão cedo para pegar o ônibus rumo ao trabalho, mas ontem foi uma exceção. Devido ao lugar que eu me encontrava, seis e meia da manhã já estava sentada no baquinho desconfortável pensando que iria dormir até chegar no meu destino. Tive sorte de não ficar em pé, logo pensei que conseguiria mesmo ir cochilando, mas a menina que estava sentada do meu lado não deixou. Não porque ela estava ouvindo funk no celular sem fone-de-ouvido, até porque acho que ninguém em sã consciência se arriscaria a fazer isso numa segunda-feira de manhã com todos mau-humorados ao seu redor, mas porque ela estava chorando. Discretamente, quietinha, olhando para a janela, quase não dava para perceber. Mas eu percebi.
Fiquei meio assustada no começo. Depois curiosa. Olhei discretamente (dentro do possível) para ela, em busca de vestígios sobre qual motivo ela estaria se debulhando em lágrimas numa segunda-feira, ás seis e meia da manhã. Perdeu o emprego? Perdeu a carteira? Perdeu a bolsa? Não, eu aposta que era outro tipo de perda: perdeu um amor. Ah o jeito que ela olhava para a janela, depois para o celular, depois balançava a cabeça como quem não entendia nada. Os suspiros, a respiração entrecortada, as olheiras, o cabelo preso, a vontade de não querer chorar mas mesmo assim não conseguir, as pernas inquietas. Já vi esse filme.
Fiquei convalescida com ela. Entendia como era aquilo. Quis dizer para ela que vai passar. Que vai doer ainda inúmeras vezes, que ela vai chorar ainda algum tempo quando lembrar, que ela vai querer esquecer mas vai se trair lembrando das coisas. Mas que passa, com certeza. Quis abraçar ela, porque sabia que ela choraria ainda mais. Quis dizer que já estive desse lado, que sei o quanto é difícil, mas que agora estou do outro e toda essa lágrima retida tentando cair discretamente durante as viagens de ônibus serviram para muita coisa.
Mas eu não disse nada, óbvio. Afinal eu nem sabia se essa minha visão hollywoodiana era o principal motivo das lágrimas dela. De repente ela tinha perdido mesmo a bolsa, ou algo assim. De qualquer forma, me lembrei que estive ali, mas agora estava sentada no banco do lado, criando hipóteses sobre a tristeza dos outros. E ali dentro daquele ônibus, lembrei do velho clichê: a dor é mesmo passageira.
6 comentários:
É verdade, não podemos saber o que relmente era. Mas eu acredito também que seja um amor perdido. Mas, um dia isso passa!
Perfeito!
Ah, sou suspeitíssima para falar, sou apaixonada por crônicas que se passam em transporte coletivo. É um lugar cheio de inspirações no quesito da escrita. Já estive no lugar da menina que sentava-se ao seu lado... é difícil mesmo.
Você narrou tudo com uma sutileza única, eu amei de verdade mesmo. (:
Beijos!
Parabéns pelo seu texto!
Sempre fantasiamos quando olhamos para alguém... sempre construímos uma história que encaixe naquele rosto desconhecido.
Um óptimo texto.
Beijinhos,
Com certeza a dor é mesmo passageira.Beijos.
Perfeito. Lindo.
A dor realmente é passageira!
Abraços, Michelle
sobreoinsolito.com
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