As águas do novo mês caem pela minha janela. Elas lavam,
elas levam – foi-se o confete, a purpurina, não há mais batuque nem corpos
quentes tentando disfarçar o frio da alma rasa. Já não é mais carnaval. Já não
é. Passa rápido.
Estamos em outra estação. Tempo em que coisas secam para que
outras floresçam. Mas como ser flor no meio de tanto coração de pedra? Não sei.
Não sei ter coração de pedra – como disse algum poeta, o meu sangra todo dia. E
pulsa. E sente. E não disfarça – sendo carnaval ou não, eis aqui um coração
gritante, que ecoa nas paredes tal qual aquele beijo, mas que não aguentou a quarta-feira de
cinzas: desbotou.
Já é março. Fevereiro foi um poema torto falado com voz
mansa.
Mas eu não sei rimar.
Já é março e eu que não tenho coração de aço, deixo
ele sangrar.
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